Un cuento peruano — parte 1

Bru,
3 min readOct 16, 2020

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Sexta-feira, 16 de Outubro de 2020
Primeiro conto, nenhuma ordem. Seguimos o sentir.

O ano era 2015. O facebook me sugeriu um evento em Porto Alegre, no qual tu estaria presente, falando sobre a escola. Eu fui até a porta do local, mas não entrei. Nosso encontro não seria o mesmo se tivesse acontecido nessa noite e sou grata por não ter sido assim.

Te encontrei alguns meses depois em uma festa na Plaza de Armas, de Cusco. Eu, mal falava espanhol. Tu, mal entendia português. Tentei me apresentar em inglês. Dançamos. No dia seguinte, eu te acompanharia de moto até o vale sagrado, mas não aconteceu. Não lembro exatamente porque, mas assim como nosso primeiro encontro não aconteceu, mais uma vez o universo nos presenteou com uma oportunidade melhor. Não nos vimos mais. Nem nos despedimos. Eu voei pra Lima dois dias depois de nos conhecermos e dali, voltaria para o Brasil após uma semana.

Lima não foi muito receptiva, admito. Os dias eram cinzas. A cidade era cinza. Na verdade, não era nada disso. Só não via a magia, a cultura vibrando, as cores, a arte, as mulheres que em Cusco sentavam-se ao meu lado, na rua, e contavam-me detalhes das suas vidas como se eu fosse uma antiga amiga. Faltava o movimento, a alegria, a beleza e o aconchego que eu sentia naquela cidade pequena. E nada disso tinha relação contigo. Mas sim, em Lima não tinha a tua (ou a nossa) energia.

Minha reunião na capital foi decepcionante e nessa noite, chorei. Coloquei energia em sair de lá e voltar pra casa, digo, Cusco. Falei contigo e tu disse “vem!” E com a ajuda da minha guardiã — mãe, eu fui. Desci do avião direto para o hostel, a Rocio e a Flor me receberam e guardaram minha bagagem. Eu corri (mentira, caminhei mesmo porque a altitude não me permitia reproduzir esse clichê de filme romântico). Inclusive, aqui nem romance existia, só um interesse mútuo — uma conexão que ia além das palavras, da razão e dos movimentos da vida. Cheguei na escola e fiquei de cantinho, acompanhando tudo. Tu sentou do meu lado e começamos a conversar, fingindo que nos entendíamos. Tentando superar a falta de conhecimento da língua alheia e a minha timidez.

Lembro como se fosse hoje… enquanto conversávamos, uma pequena menina chegou chorando e só no teu abraço, se acalmou. Contou que o pai tinha brigado (maneira de dizer, porque foi bem mais do que isso) com a mãe dela. Com a tua calma e sabedoria, ela desabafou, ficou mais tranquila e em seguida já estava brincando com as amigas. Perguntei o que tinha acontecido e tu me explicou dizendo que era normal. Infelizmente, não podia fazer muito além do que já fazia. Ali, muitos pais eram assim e mesmo que tentássemos, a única mudança possível era através das crianças. Esse foi meu primeiro aprendizado contigo. Não sei especificar o que, talvez tudo. Talvez a calma, o acolhimento. Talvez tu, como ser humano, que eu mal conhecia e já me percebia encantada.

Saímos da escola e fomos jantar. Eu, com uma das minhas mochilas que estava sempre pesada, já que eu carregava vários casacos junto. Cusco no inverno ia dos 25 graus durante o dia para os 2 graus a noite. Mas nada a reclamar. Era e continuo achando uma das cidades e um dos climas mais bonitos e intensos que já vivi.

Foi naquela noite que tu me ensinou a sutileza da troca. Uma simples respiração, a vulnerabilidade de olhar nos olhos e respirar o ar um do outro. Nós nos respirávamos. E, inevitavelmente, nos beijamos. Um nada-simples-beijo que terminou em mais duas viagens ao Peru no mesmo ano, um namoro a distancia e uma quase mudança — de vida e de país.

Essa era uma carta para dizer o que eu aprendi contigo. Mas me peguei nostálgica com o que vivemos por um único motivo: foi mágico. Brigamos, sofremos, choramos, rimos, nos amamos, amamos as crianças, os cachorros, os planos e a vida. Subimos e descemos montanhas, picos de alegria e tristeza, e como tu dizia: todas eram necessárias e precisavam ser sentidas com a mesma verdade. Sentimos tudo, sentimos muito. Plantamos flores no jardim e nos despedimos.

Prometo escrever outra carta contando tudo o que eu aprendi contigo. Não foi pouco, foi tanto quanto a intensidade do amor que vivemos e que, sabemos, segue em cada um de nós. Como uma história bonita, que não terminou, mas se transformou.

Amanhece em Porto Alegre. 05:36 e eu vou dormir.
Volto em breve.

(não) Me espere.

Com carinh(a) de sono,
Bru

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Bru,

la bruja — mujer medicina — latina || oferecendo vivências terapêuticas n' @acasadabrunanomundo